sexta-feira, 30 de outubro de 2009

AVISO AOS NAVEGANTES...

Recebi diversas reclamações de pessoas que acessaram o blogue, no sentido de que não estavam conseguindo deixar comentários nos "posts".

Alertado sobre o problema, alterei a configuração do blogue e, a partir de agora, creio que não haverá mais nehuma dificuldade para comentar as matérias, portanto, comentem!

Jonilton Lemos

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO PENAL E A MILITÂNCIA NA ADVOCACIA CRIMINAL

A obra “Direito Constitucional Contemporâneo”, que acabo de ler, do Prof. Luís Roberto Barroso, não tenho dúvidas em afirmar, deve ser encarada como imprescindível na formação do profissional do direito na atualidade.

Entre tantas questões interessantíssimas, o autor aborda a questão da constitucionalização do Direito Penal no Brasil e no mundo.

Sob esse enfoque, a Constituição funcionaria como um filtro através do qual devem passar todas as normas penais. Assim, o Texto Maior deixa de ser um simples fundamento de validade da legislação infraconstitucional, para constituir-se em parâmetro de interpretação de todo o ordenamento jurídico, a fim de que sejam assegurados os valores mais caros ao espírito da Constituição.

À luz desse fenômeno, discute-se a possibilidade de se isentar de pena a prática de determinados crimes, em específicas circunstâncias, diante da manifesta desproporção entre a aplicação da pena privativa de liberdade e resultado lesivo da conduta do agente. Tome-se como exemplo, a hipótese da mulher que convive maritalmente com o traficante, e é por este coagida a também “atender”os usuários que batem à sua porta para comprar a substância entorpecente, ou mesmo àqueles casos das “mulas” do tráfico, geralmente pessoas humildes, necessitadas, que são usadas, por grandes traficantes, para transportar drogas de uma localidade para outra.

Nesses casos, embora a culpabilidade seja reduzida, em relação ao verdadeiro traficante, essas pessoas são condenadas à pena mínima de cinco anos de reclusão, o que é um grande paradoxo.

Segundo a visão constitucional do direito penal, o tratamento jurídico a ser dado a determinada infração ou a pena aplicável não deve ir além, nem tampouco ficar aquém, do necessário à proteção dos valores constitucionais que regem a matéria.

Assim, nos exemplos acima citados, haveria a inconstitucionalidade da norma penal por ausência de razoabilidade ou proporcionalidade, especialmente na dimensão da vedação do excesso.

Em que pese essas discussões estarem na ordem do dia, contando inclusive com precedentes do Supremo Tribunal Federal, como no HC 73.662/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, no badalado caso da absolvição do jovem acusado de estupro por ter mantido relação sexual com uma menina de doze anos, quem advoga na área criminal sabe o quanto é difícil emplacar essas teses no nosso dia-a-dia.

Infelizmente, salvo valorosas exceções, há quase que um burocratização do processo penal, onde a busca da verdade real e a aplicação da justiça é deixado muitas vezes de lado em detrimento da “produtividade” e do batimento de metas de julgamento dos processos.

A verdade é que se o advogado levantar a tese de inconstitucionalidade material da norma penal ao caso concreto, as chances de ver os seus argumentos completamente ignorados na sentença são quase absolutas.

Evidentemente que o verdadeiro advogado criminalista não desanima com essas dificuldades. O nosso papel é persistir, é lutar para que novos horizontes despontem no tratamento da matéria.

O que nos angustia, quem é militante sabe disso, é que não é incomum que o advogado suscite teses que fogem um pouco do trivial em um determinado caso, mas o próprio defendente e/ou sua família, não permite que o causídico leve essas questões ao tribunais superiores.

Explico.

Na advocacia cível, por exemplo, geralmente o cliente procura um advogado em que confia e esse advogado consegue desenvolver um trabalho com começo, meio e fim, chegando até o STJ e o STF.

Já na advocacia criminal, a dificuldade é um pouco maior.

Ressalvados a clientela dos crimes contra a ordem tributária ou quando o acusado tem um grau de instrução maior, a mudança de advogados no mesmo processo é muito grande, especialmente se réu estiver preso.

Várias vezes já fui procurado para assumir determinados casos e, ao analisar o processo, verifiquei que em curto espaço de tempo vários advogados foram contratados e dispensados pela família, ou seja, o advogado não teve como desenvolver o seu trabalho.

Nessas situações, o melhor é não assumir a causa.

Levanto essas questões neste espaço, pois sei que as pessoas que acessam o nosso blogue têm perfis bastante diversificados, são profissionais que atuam em outras áreas e têm curiosidade sobre as questões da advocacia criminal, colegas que militam na advocacia criminal e compartilham das mesmas lutas e angústias, estudantes de direito, ávidos por informações da prática da advocacia, e que no futuro estarão ocupando o seu espaço no mundo jurídico.

A nossa pretensão é incentivar o debate sobre esses temas para, quem sabe, contribuirmos com o avanço das instituições jurídicas, ou mesmo oferecer uma luz a quem eventualmente esteja envolvido, de alguma forma, com uma ação penal, e não compreende ao certo o trabalho que está sendo realizado pelo seu advogado.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009


A CORRETA APLICAÇÃO DA LEI SECA

O anúncio, na imprensa local, da retomada do endurecimento da fiscalização da chamada “lei seca” (Lei n° 11.705/2008), chama atenção para a sua correta aplicação.

Assim que a lei seca entrou em vigor, os telejornais apresentaram diversas matérias mostrando uma fiscalização intensa e performática, alardeando-se excelentes índices de diminuição de vítimas fatais decorrentes de acidentes de trânsito. Pouco tempo depois, essa fiscalização foi diminuindo, e o número de mortes decorrentes do trânsito voltou a crescer.

No Brasil, quando se trata de política criminal, a tendência natural das pessoas, influenciadas por programas policiais sensacionalistas, é protestar pelo aumento das penas.

No caso específico da chamada Lei Seca, formou-se um estardalhaço sobre uma alteração do Código de Trânsito Brasileiro que pouco mudou, em essência, o que já dispunha a legislação anterior.

As penas para o crime de embriaguez ao volante permanecem as mesmas, ou seja, ao contrário do que muitos foram induzidos a pensar, a possibilidade de ser preso em flagrante pela prática dessa infração penal não surgiu com a Lei Seca, mas existe desde a entrada em vigor do CTB, no ano de 1997.

Embora sempre se espere que da modificação da legislação resulte o seu aprimoramento, relativamente aos dispositivos que tratam das infrações administrativa e penal relacionadas à direção de veículo automotor após a ingestão de bebidas alcoólicas e similares (CTB, arts. 165 e 306), o novo regramento mostra-se demasiadamente “aberto”, dando margem à discussões, em meio à doutrina e jurisprudência pátrias, sobre a correta interpretação dos seus dispositivos.

O art. 165 do CTB, que trata da infração meramente administrativa, com a nova redação dada pela Lei n° 11.705/2008, apresenta a seguinte redação:

“Art. 165. Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência (...).” (sem grifo no original)

Diante da expressão sob influência, indaga-se: será que a infração administrativa caracteriza-se com a simples direção de veículo após o condutor ingerir álcool ou substância similar, ou seja, o simples fato de beber dois ou três copos de cerveja e dirigir, significa infringir a lei?

Penso que não.

Com efeito, vários estudiosos têm se debruçado sobre o tema, chegando à conclusão de que a expressão “sob influência” significa, sofrendo seus efeitos, dirigindo de forma anormal, realizando manobras proibidas, desrespeitando os semáforos e a sinalização de trânsito, etc.

Nesse sentido, o Prof. Damásio de Jesus esclarece que:

“(...) surpreendido o motorista dirigindo veículo, após ingerir bebida alcoólica, de forma normal, `independentemente do teor inebriante`, não há infração administrativa, não se podendo falar em multa, apreensão do veículo e suspensão do direito de dirigir. Exige-se o nexo de causalidade entre a condução anormal e a ingestão de álcool.” (http://blog.damasio.com.br/?p=487)

Seguindo essa linha de raciocínio, se um motorista, dirigindo corretamente na via pública, é flagrado no exame do bafômetro com teor alcoólico inferior a 6 decigramas, não poderá ser autuado administrativamente.

Relativamente ao crime de embriaguez ao volante, o raciocínio é parecido. Confira-se a nova redação do dispositivo:

“Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência (...)” (grifei)

Procedendo-se a uma interpretação meramente literal e isolada do comando legal acima transcrito, poder-se-ia chegar à equivocada conclusão de que a expressão “sob influência”, não se refere à ingestão de substância alcoólica, mas tão somente a “qualquer outra substância psicoativa que determine dependência”.

Tal entendimento, contudo, não resiste à aplicação do princípio da razoabilidade, posto que, se a infração administrativa, que é o menos, exige o “estar sob a influência”, conforme já demonstrado, a infração penal, que é o mais, não pode prescindir dessa elementar.

De mais-a-mais, seria um rematado contra-senso considerar tipificado o crime de embriaguez ao volante pela só presença de determinada quantidade de álcool no sangue e, no caso de outra substância psicoativa, exigir a influência.

Finalmente, existem outros dispositivos trazidos pela lei nova que denotam, sob a ótica de uma interpretação sistemática, o ponto de vista aqui defendido.

O art. 7° da lei nova estabelece:

“A Lei n° 9.294, de 15 de julho de 1996, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 4°-A:
`Art. 4°-A Na parte interna dos locais em que se vende bebida alcoólica, deverá ser afixado advertência escrita de forma legível e ostensiva de que é crime dirigir sob a influência de álcool, punível com detenção`.” (grifo nosso)

Em síntese, as duas infrações exigem que o condutor esteja conduzindo veículo automotor sob a influência de álcool ou similar, diferenciando-se pelo o limite do teor alcoólico encontrado em seu sangue.

Assim, conclui-se que a redução inicial dos índices de vítimas fatais decorrentes de acidentes automobilísticos não se deveu ao advento da lei nova, mas à fiscalização e à punição rigorosas, de modo a corroborar o que já era apregoado por Cesare de Beccaria em meados do século XVIII, em sua célebre obra Dos Delitos e das Penas, para quem o objetivo de prevenção geral da pena, ou seja, o desestimulo à generalidade das pessoas à pratica de crimes, não precisa ser obtido através do terror (aumento da pena), mas com a eficácia e certeza da punição. (escrito por Jonilton Lemos)